Num dia desses de domingo tive a ideia de registrar todas as ideias que merecessem a dedicação de um tempo: tanto para pensá-las, quanto para registrá-las, incluindo executá-las (se possível for...), pois afinal quantas e infinitas ideias percorrem os seres a todo o momento e não efetivamente são realizadas, mesmo que um gigantesco potencial tenha a ideia idealizada.
Sendo assim estes imensuráveis ideais quando atravessarem a minha mente terão no mínimo um registro, minha parcela e ponto de vista sobre como poderia realizar o imaginário e fantasioso mundo das ideias.
E no meio desta ideia de registrar todas as ideias surgi outra ideia, que pude concretizá-la, e mais consagrá-la, pois a ideia me pegou de súbito durante a execução, portanto pensei enquanto deseja escovar os dentes, o porque não escova-los, mas não simplesmente, e sim efetivamente escova-los? Assim como se fosse a única e última coisa que deveria fazer.
Logo então fio-de-dente e escova além da pasta dental, já estavam a mão. Apressei-me em entrar ao banheiro, como quem ansiasse iniciar logo algo que desejou a muito atrás e aguardará demasiado tempo para realizar. Sendo assim me coloquei a conhecer cada cen-tí-me-tro da boca. Parecia um território nunca antes explorado com tamanha atenção...
Mais é claro! Antes não estava presente enquanto escovava, estava a pensar sobre o que faria a seguir - mas não agora, não mais! Naquele momento a ideia era estar ali, e ali estava eu, saboreando cada movimento.
Não só a sensação de limpeza me tomava sentido naquele ritual, mas pude reconhecer até nos movimentos das mãos e dos braços um porque naquilo tudo. Senti inclusive qual foi o impulso que moveu não só o homem que criou ferramentas, como a nossa atual escova dental, mas também senti como o primeiro macaco que desejou limpar seus dentes. Um ato primitivo, primário, uma necessidade fisiológica, a lógica seria então que já que precisa, precisa serei.
E fui, e continuarei tentando ser, precisa, presente e se possível for ainda contente e viva, além de Anna Bida nesta vida. :)
:]
ResponderExcluirSê mesmo o instante. Serena nele. Sê o mistério das pequenas (e grandes) coisas do agora.
Um beijo na alma.
"V - Há Metafísica Bastante em Não Pensar em Nada
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.
Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).
O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.
Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?
"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.
Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!
(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.
E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora."
O guardador de rebanhos - Alberto Caieiro
Gratidão perpetua, cósmica, metafísica por ter compartilhado Alberto Caieiro! Foi como um presente, ainda mais por te-lo atrelado/associado tão belo texto com meu universo poético... Que possamos trocar ainda mais (agora e sempre)! Abraço grande e fraterno! Namastê
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